(setembro de 1947)
David Horowitz, State in the Making, Nova York: Alfred Knopf, 1953, pp. 233-235.
Na década de 1930, os líderes sionistas costumavam abordar os árabes que viviam na Palestina em busca de um diálogo sobre como talvez reduzir as diferenças nacionalistas entre as duascomunidades. David Ben-Gurion, chefe da Agência Judaica, por diversas vezes teve discussões com: membros da família Nashashibi em Jerusalém, Awni Abd al-Hadi, um nacionalista palestino convicto e, na década de 1940, com Musa al-Alami. Também naquela mesma década, após a publicação em 1947 do Relatório do Comitê Especial da ONU sobre a Palestina, o qual previa a criação dos Estados árabe e judeu na Palestina, um regime internacional para Jerusalém e a união econômica entre os dois Estados propostos, os sionistas prosseguiram o diálogo com oslíderes árabes dos Estados vizinhos. Eles tiveram discussões com Emir Abdullah daJordânia,várioslíderesárabessírios
e, em setembro de 1947, com o conhecido egípcio nacionalista ‘Azzam Pasha, que foi o primeiro secretário-geral da Liga Árabe (entre 1945 e 1952). Os três membros da Agência Judaica que se encontraram com ‘Azzam Pasha foram Aubrey (Abba) Eban, Jon Kimche e David Horowitz; todos eles trabalhavam para a Agência Judaica na Palestina. O encontro foi realizado em Oxford, na Inglaterra, no dia 16 de setembro de 1947. O relato de Horowitz sobre aquele encontro revelou que ‘Azzam Pasha rejeitava completamente um Estado judeu, sugeria que a violência era o único recurso a ser utilizado e especulava que a Palestina poderia perder o controle árabe. Os esforços sionistas para o estabelecimento de um diálogo com o líder palestino ou líder da Liga Árabe foram malsucedidos em termos de duração e conteúdo. A posição antagônica de ‘Azzam Pasha com relação ao sionismo está presente na descrição daquele encontro.
– Ken Stein, maio de 2019
Ele [Jon Kimche], em uma manhã de céu claro, telefonou dizendo que seria possível marcar uma entrevista com Abdul Rahman Azzam Pasha, líder e secretário-geral da Liga Árabe. Eu concordei imediatamente e o encontro foi marcado para o dia seguinte, às 5 horas da tarde.
Aubrey, Jon Kimche e eu fomos ao Hotel Savoy, onde ‘Azzam Pasha estava hospedado, e pouco tempo depois estávamos sentados na presença de um árabe moreno, de rosto magro, com olhos escuros penetrantes, que nos recebeu com muita cortesia.
Eu dei início à conversa. Após apresentar minhas considerações sobre o relatório do Comitê Especial da ONU para a Palestina (UNSCOP), eu comecei a analisar a situação: “A presença de judeus no Oriente Médio é fato consumado. Mais cedo ou mais tarde, os árabes terão que admitir e aceitar o fato.
Vocês, árabes, não podem eliminar ou exterminar meio milhão de pessoas. Nós, de nossa parte, desejamos
verdadeiramente chegar a um acordo com os árabes e estamos dispostos a fazer sacrifícios por isto.
“Tal acordo será alcançado a tempo, por que então precedê-lo com brigas, lutas e derramamento de sangue?” Não existem interesses fundamentais conflitantes e obstáculos
insuperáveis envolvidos em qualquer acordo. Não estamos desejando a expansão, a conquista ou o domínio de outros povos. Queremos nos tornar integrados na estrutura do Oriente Médio para que possamos nos beneficiar mutuamente.
“Reconhecemos que isto é de vital interesse para nós. Eu entendo que o senhor não deseja confiar em promessas e sentimentos grandiosos. Consequentemente, estamos prontos para propor um plano concreto para a coordenação de interesses e concretização da paz entre os dois povos.
“O plano é dividido em três partes:
“Primeiro, a parte política: ou seja, o estabelecimento de um acordo com a Liga Árabe com base em um sistema bem definido de direitos e obrigações.
“Segundo, a segurança, que terá como propósito eliminar as suas suspeitas infundadas acerca de nossas supostas ambições expansionistas, embora
continuamos a declarar e a repetir que o nosso único objetivo é reunir centenas de milhares de nossos irmãos dentro dos limites que nos cabe para restabelecermos o deserto, embora qualquer tentativa de nossa parte para escapar desta estrutura encontrará a oposição do mundo todo. Nós estamos preparados para oferecer-lhe garantias concretas, tanto de nossa parte como das Nações Unidas.
“Por fim, o plano terá uma módulo econômico a ser elaborado mediante consulta entre as partes e tratará do desenvolvimento conjunto do Oriente Médio, em benefício e prosperidade das massas árabes.
‘Azzam Pasha disse: “O mundo árabe não está disposto a fazer acordos. É provável, sr. Horowitz, que seu plano seja racional e lógico, mas o destino das nações não é decidido por uma lógica
© Center for Israel Education 2012
racional. As nações jamais cedem; elas lutam. Vocês não conseguirão nada por meios pacíficos ou acordos. Vocês podem, talvez, conseguir alguma coisa mas apenas pela força das armas. Nós tentaremos derrotá-los. Eu não tenho certeza se conseguiremos, mas vamos tentar. Nós fomos capazes de afugentar os cruzados, mas por outro lado, perdemos a Espanha e a Pérsia. Pode ser também que percamos a Palestina. Mas é tarde demais para falar em soluções pacíficas”.
Aubrey Eban: “O relatório do UNSCOP estabelece a possibilidade de um acordo satisfatório. Por que pelo menos não tentamos fazer um esforço para chegarmos a um acordo sobre essas linhas? De qualquer modo, nossa proposta é apenas um esboço e apreciaremos qualquer outra contraproposta de sua parte”.
‘Azzam Pasha: “Apenas aceitaremos um acordo se nossas condições forem aceitas. O mundo árabe considera vocês invasores e está pronto para lutar. O conflito de interesses entre as nações não é, de um modo geral, favorável ao estabelecimento de nenhum acordo, exceto o conflito armado.
Horowitz: “Então o senhor acredita apenas na força de armas? O senhor não acha que houve alguma forma de progresso no estabelecimento de acordos sobre questões controversas entre os diferentes povos?
Azzam Pasha: “Está na natureza dos povos almejar a expansão e lutar pelo que consideram fundamental. É possível que eu não represente, na verdadeira acepção da palavra, o novo espírito que motiva o meu povo. Meu filho mais novo, que anseia lutar, indiscutivelmente simboliza esse espírito melhor do que eu. Ele já não acredita em nós, da velha geração.
Quando ele retornou de uma das mais violentas demonstrações estudantis contra os britânicos, eu disse a ele que, na minha opinião, os britânicos deixariam o Egito sem a necessidade de demonstrações como aquela. Surpreso, ele me perguntou: “Mas pai, você é mesmo tão a favor dos britânicos assim?”
“As forças que motivam os povos não estão sujeitas ao nosso controle. Elas são forças objetivas. Talvez teria sido possível chegar a um acordo no passado se houvesse existido uma união vinda de baixo. Mas isto já não é mais viável. Vocês se referem ao Oriente Médio. Nós não reconhecemos esse conceito. Nós pensamos apenas em termos do mundo árabe. E a maior força que nos impulsiona é o nacionalismo. Nós não precisamos de sua assistência para o desenvolvimento econômico. Nós temos apenas um critério, o critério da força. Se eu fosse um líder sionista, eu provavelmente teria um comportamento semelhante. Vocês não têm alternativa. De toda a forma, agora o problema só pode ser resolvido com a força de armas”.
A impetuosidade e o fanatismo de ‘Azzam Pasha nos impressionou profundamente. A sua visão do mundo tinha algo do determinismo biológico da teoria racial. O cenário realista traçado por ele era fatalista em seu objetivo, como que de forças incontroláveis surgindo e transbordando no palco da história.
Azzam exaltou sua simpatia aos princípios democráticos durante nossa conversa subsequente, é verdade, mas suas crenças extremistas beiraram o fascismo. A admiração pela força e violência evidenciada em suas declarações nos pareceu algo estranho e repugnante, e a sua descrição sobre qualquer tentativa de acordo ou paz como sendo uma ilusão ingênua nos deixou totalmente sem esperanças.
Apesar da atmosfera amável e cordial, sentimos o completo impacto histórico deste dramático encontro. Com ele despareceu o último esforço para superar o abismo. Assim, a ilusão de alcançar um acordo e uma solução pacífica teve fim.
Saímos do hotel em direção à rua Strand irritados e deprimidos. Azzam tinha conseguido transmitir para nós um pouco de seu caráter e ponto de vista. Vimos despontar diante de nós
forças latentes e poderosas que inevitavelmente nos levariam a uma guerra sanguinária, cujo desfecho ninguém poderia prever”.